quarta-feira, 1 de abril de 2009

«Princípio da responsabilidade»

[Artigo de opinião da autarca Fátima Campos] "Infelizmente, o grupo parlamentar do Partido de que faço parte parece não considerar relevante o “princípio da precaução” e não tomar a sério os avisos da Organização Mundial de Saúde (OMS), preferindo enredar-se numa argumentação que nada deve à lógica para justificar o voto contra projectos de Lei importantes e necessários.
Não tenho dúvidas de que os motivos que levaram o Grupo Parlamentar do PS a chumbar os diplomas que estabeleciam uma regulamentação mais rigorosa da edificação das linhas de muito alta tensão têm a ver com questões formais e não com a substância dos mesmos, ou seja, com a chamada “politiquice” e não com o alcance das medidas propostas. Por outras palavras, a origem dos projectos (Partidos da oposição) condenou-os ao fracasso. Com prejuízo das pessoas. O que muito lamento e critico.
A contestação das populações, dúvidas científicas e decisões (mesmo que não definitivas) dos tribunais levaram alguns Partidos de oposição, no essencial e apesar de ligeiras diferenças, a tentar mudar a Lei, consagrando nesta o chamado “princípio da precaução”.
Propuseram-se coisas tão razoáveis como o enterramento das linhas de muito alta tensão, alteração dos actuais limites máximos de exposição dos campos electromagnéticos, alargamento da distância das linhas de muito alta tensão a infraestruturas como escolas, hospitais, prédios/casas, entre outras medidas.
A tudo o Grupo Parlamentar do PS disse NÃO!
No meu juízo - alicerçado na análise que há longos meses venho construindo de todo este processo -, porque as medidas foram apresentadas pela oposição mas também porque não quer melindrar a REN, com quem tem mantido uma relação de subserviência, no mínimo, insólita.
Atentemos, sem preconceito e com abertura de espírito, em alguns argumentos esgrimidos pelo Grupo Parlamentar do PS para rejeitar os projectos de Lei.
À cabeça de todas as rejeições está a máxima “sem sustentabilidade científica”. O que me suscita, de imediato, duas perguntas:
- A actual Lei tem que sustentabilidade científica (no modo e no tempo)?
- A Organização Mundial de Saúde (e o “princípio da precaução”) não é idónea ou as suas recomendações levantam algum tipo de reservas ao Grupo Parlamentar do PS?
Refere o deputado socialista Bruno Veloso (citado pela imprensa): “a OMS reconhece a possibilidade dos campos electromagnéticos de baixa intensidade poderem estar associados a algumas formas de cancro e recomenda a adopção de formas de precaução, desde que não coloquem em causa os benefícios sociais e que tenham custos reduzidos”. A citação é uma deturpação grosseira do que diz a OMS e basta pensar um pouco (que pena este país andar tão adormecido...) para perceber o absurdo desta posição. Na lógica do deputado Bruno Veloso, a OMS fecha os olhos ao risco de cancro (doença “menor”...) se se puserem em causa benefícios sociais e/ou custos reduzidos. Como é óbvio, para OMS ou para qualquer organização/entidade/instituição responsável e de bem, a saúde é um valor supremo, prioritário, não secundarizável, com maioria de razão quando se trata do risco de contaminação por uma das doenças mais letais.
Outros dos argumentos, desta vez para aniquilar o enterramento das linhas, são os de que o enterramento não diminui o risco de contaminação e o seu custo é 6 a 10 vezes superior ao da edificação de uma linha aérea.
A ignorância é atroz e a “lógica é uma batata” neste raciocínio. Então uma linha enterrada a alguns metros de profundidade é tão perigosa e tem um potencial de contaminação tão grande quanto o de uma linha aérea que, muitas vezes, passa a escassos metros de uma varanda ou janela? E são conhecidos todos os estudos e soluções técnicas sobre o custo do enterramento das linhas ou o PS/Governo está a fazer fé nos estudos e orçamentos apresentados por uma das partes interessadas (a REN)? E, mesmo que fossem esses os custos (desconfio seriamente que o não são), a defesa da Saúde Pública não justificaria esse investimento, essa protecção das pessoas?
O PS perdeu mais uma oportunidade de rectificar uma posição errada e, mais importante que isso, uma Lei que é nociva à população. E quem hoje decide neste sentido aceitará amanhã ser responsável – política e judicialmente – pelos danos causados à saúde de quem convive perto destas linhas de muito alta tensão?
Era uma pergunta que muito gostaria de ver respondida. Em nome do princípio... da responsabilidade!!!
Fátima Campos
Presidente da Junta de Freguesia de Monte Abraão"

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